No país inteiro, quase 9 mil obras que usam dinheiro federal estão paralisadas ou inacabadas. Um desperdício de dinheiro que o Tribunal de Contas da União atribuí à falta de coordenação entre as autoridades públicas.
A obra está com cara de nova - e é. A Prefeitura de São Paulo entregou a UPA, Unidade de Pronto-Atendimento, em agosto. Fica em um bairro da Zona Leste da cidade. Os moradores dizem que fazia falta.
“Tem muita demanda. Está cheio. Aí é cheio direto”, diz a auxiliar de limpeza Ivonete Lima Alves.
Só que o plano original para este endereço era mais ambicioso. Lá também deveria funcionar um Hospital Dia, uma estrutura mais complexa. Essa história começou em 2015, quando a Prefeitura de São Paulo assinou um convênio com o governo federal para implantar um Hospital Dia no prédio abandonado de uma antiga maternidade.
Na época, tinha até placa anunciando a obra. O orçamento inicial era de quase R$ 5 milhões – R$ 3 milhões do governo federal. Mas, ao longo dos anos, os prazos para o término do contrato foram adiados e até a meta mudou: houve a exclusão da "reforma de Hospital Dia - Rede Hora Certa" e a inclusão de "reforma de Centro Especializado de Reabilitação". Oito anos depois, o que saiu do papel até agora foi a UPA.
“E aí quando as obras demoram assim é complicado para população”, diz Marcio Carvalho, agente administrativo.
A Prefeitura de São Paulo declarou que investiu mais de R$ 14 milhões na UPA e que os R$ 3 milhões do governo federal vão ser utilizados na construção do Centro Especializado em Reabilitação ao lado da UPA – em um terreno que ainda está vazio. A data para prestação de contas vence em fevereiro.
Enquanto isso, a construção consta de um levantamento feito pelo Tribunal de Contas da União sobre obras com verbas federais que estão paralisadas, já que o projeto original - que previa a construção de um Hospital Dia - não foi adiante.
Segundo o TCU, que é um órgão de controle e fiscalização, das pouco mais de 21 mil obras com dinheiro da União existentes hoje no país, 8.603 estão paralisadas ou inacabadas. A maioria na educação básica. Juntas, todas essas construções paralisadas somam mais de R$ 8,2 bilhões, dinheiro público que já foi investido, mas que ainda não gerou o retorno que população esperava.
“Esses recursos não voltaram para o povo. Recursos como na saúde, recursos na educação, por exemplo, para construção de creches. Também é um prejuízo social muito grande. Escolas, hospitais, açudes, barragens e outras áreas também”, afirma o ministro do TCU Vital do Rêgo.
É mais ou menos como quando a gente vai construir ou reformar uma casa. Para a obra andar no tempo certo e não estourar o orçamento, tem que planejar direitinho, pesquisar preços e escolher os fornecedores, conseguir as licenças e permissões, definir prazos para a entrega de cada etapa. E sempre tem alguém que toca tudo isso.
Mas quando a gente está falando de governo, esse planejamento fica espalhado por diversos órgãos, ministérios, secretarias federais, estaduais e municipais. E, segundo o TCU, muitas vezes, ninguém sabe direito em que pé estão as coisas. Uma situação que piora quando a obra se arrasta por mais de uma gestão, e mudam os responsáveis.
“É impressionante, independente do governo, as constatações são as mesmas: falta de comando central que possa determinar as mesmas ações para os diversos ministérios. O ministério tenta resolver de um jeito, o outro tenta resolver do outro. Não há nenhuma ação que seja vertical e que possa na transversalidade atingir a todos os ministérios”, diz Vital do Rêgo.
O levantamento do TCU mostra que o Maranhão é o estado recordista em obras paradas - contratadas ao longo de várias gestões. Depois vem Bahia, Pará, Minas Gerais, Ceará e Goiás.
“O TCU identificou que não há ainda no país um plano nacional para poder atacar esse problema das obras paralisadas e fez uma série de recomendações para os órgãos centrais para poder criar um plano nacional, criar uma estratégia de priorização, de retomada dessas obras paralisadas”, explica Keyla Araújo Boaventura, auditora-chefe da AudUrbana do TCU.
Mas a falta de centralização prejudica até a contagem de obras paradas. Uma, no Maranhão, não está na lista. Mas tem recursos federais do braço do PAC, o Programa de Aceleração do Crescimento, destinado para cidades históricas. O dinheiro foi liberado em 2014, quando a Universidade Federal do Maranhão começou a reforma de um prédio do início do século XIX - e que abrigou duas faculdades até meados da década de 1990. A obra está paralisada desde 2018 e do antigo Palácio das Lágrimas sobraram as ruínas.
A professora de gestão pública da FGV Cibele Franzese diz que, nas urgências e emergências do dia-a-dia, muitas obras acabam ficando de lado. É por isso que a gestão eficiente é tão importante.
“Em alguns governos, isso pode ficar na Secretaria de Governo, pode ficar na Casa Civil ou você pode criar uma unidade diretamente ligada ao chefe do Executivo que faz o monitoramento das prioridades de governo. Aqueles projetos vão ser licitados, aqueles projetos vão ter parecer jurídico, aqueles projetos vão ter orçamento e aqueles projetos vão ser monitorados com a presença do chefe do Executivo. E aí você garante que a população vai receber aquelas entregas no final do governo”, explica Cibele Franzese, coordenadora de graduação de administração pública da FGV.
A Universidade Federal do Maranhão declarou que a obra atrasou por motivos logísticos, como a necessidade de demolição feita de forma manual e a dificuldade de recebimento do material. A universidade afirma que houve uma revisão de todos os projetos em 2022; e que pretende reformar o Palácio das Lágrimas para instalar a escola de música da universidade.
A Casa Civil declarou que o governo federal está determinado a retomar as obras paradas; que trabalha para cumprir as recomendações do TCU, que incluiu essas obras no Novo PAC; e que já publicou no Diário Oficial a lei que instituiu o Pacto Nacional pela Retomada de Obras Inacabadas.
Jornal Nacional/TV Globo Foto Reprodução
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